Segunda, 6 Outubro, 2025 - 14:41

A caça e o tiro desportivo valem 180 mil milhões de euros na Europa — e mais de 2 mil milhões em Portugal

Um setor que cria emprego, protege o território e continua invisível nas políticas públicas

A caça e o tiro desportivo movimentam 180 mil milhões de euros por ano na Europa e garantem mais de 1,1 milhões de empregos em 30 países.
Em Portugal, representam mais de dois mil milhões de euros e quase 19 mil postos de trabalho.
São números impressionantes, que traduzem uma realidade económica e social de grande dimensão — mas que continuam, em larga medida, fora do radar das políticas públicas nacionais.

“Os números falam por si — mas continuam a cair em ouvidos surdos”, afirma Jacinto Amaro, presidente da Federação Portuguesa de Caça (FENCAÇA).
“Reconhecer o setor é investir no território, no emprego local e na conservação ativa.”

Europa: a força de um setor que une economia e conservação

O estudo “The socio-economic impact of hunting, sports shooting and related sectors in Europe”, coordenado pelo Prof. Fabio Musso da Università degli Studi di Urbino Carlo Bo, foi apresentado no Parlamento Europeu a 30 de setembro de 2025.
Os resultados surpreenderam até os próprios investigadores: a caça, o tiro desportivo e os setores ligados às armas, munições, componentes e serviços representam 0,99% do PIB europeu, com um impacto total de 180 mil milhões de euros anuais.

O estudo, que abrange 27 Estados-Membros da União Europeia, bem como Noruega, Suíça e Reino Unido, estima que existam na Europa 12,4 milhões de caçadores e praticantes de tiro desportivo.
O gasto anual conjunto destas atividades ultrapassa 96 mil milhões de euros, divididos quase equitativamente entre caça (48,8 mil milhões) e tiro (47,5 mil milhões) — um fluxo económico que movimenta hotelaria, restauração, transporte, seguros, turismo e logística em todo o continente.

A indústria de armas e munições civis soma mais de mil empresas e 27 mil trabalhadores, com saldo comercial positivo de cerca de 1,8 mil milhões de euros, reforçando o peso exportador da Europa neste setor.
Os setores complementares e auxiliares empregam mais de 40 mil pessoas e geram 6,28 mil milhões de euros de faturação anual, comprovando que a cadeia económica ligada à caça e ao tiro tem uma base sólida e diversificada.

“Este estudo é uma excelente notícia para os sete milhões de caçadores europeus”, sublinhou Laurens Hoedemaker, presidente da FACE.
“Mostra que o valor socioeconómico da caça é muito superior ao que se supunha e que os caçadores contribuem ativamente para a economia e para a natureza.”

Também a eurodeputada Isabel Benjumea destacou, na sessão de apresentação, que “os decisores políticos devem considerar seriamente estes dados ao formular políticas para setores que são socialmente enraizados e economicamente relevantes”.

A Comissão Europeia, representada por Frank Vassen, reconheceu “a importância das comunidades rurais e dos caçadores para a saúde dos ecossistemas e a gestão das espécies”, realçando que a futura Lei de Restauração da Natureza será crucial para fortalecer essa ligação entre biodiversidade e atividade humana sustentável.

O estudo não avaliou ainda o contributo económico da carne de caça nem os benefícios ambientais e sociais da atividade, que deverão ser objeto de futuras investigações complementares.

A Federação Portuguesa de Caça (FENCAÇA) é membro da Federação Europeia de Caça e Conservação (FACE), representando oficialmente os caçadores portugueses junto das instituições europeias.
Através desta filiação, a FENCAÇA participa ativamente na defesa das políticas de conservação, gestão de habitats e valorização económica do setor cinegético, assegurando que a voz de Portugal é ouvida nos principais fóruns europeus sobre caça e biodiversidade.

Portugal: dois mil milhões de euros e 19 mil empregos

Em Portugal, os números confirmam a importância do setor.
O valor económico total da caça e do tiro desportivo é estimado em 2,097 mil milhões de euros, com 18.958 empregos diretos e indiretos, equivalendo a 0,97% do PIB nacional.

O país conta com 115 mil caçadores registados e 78 mil praticantes de tiro desportivo, que movimentam anualmente 1,05 mil milhões de euros em despesas diretas.
A indústria nacional de armas e munições gera 80 milhões de euros por ano e 500 empregos diretos, aos quais se somam 115 milhões de euros e 655 postos de trabalho dos setores de suporte e distribuição.

Mas o impacto vai muito além da economia industrial.
Clubes, federações, zonas de caça, operadores turísticos e organizadores de eventos representam quase oito mil empregos, distribuídos por centenas de concelhos, contribuindo para a coesão do território e para a vitalidade das zonas rurais.

Além disso, a caça financia conservação ativa, gestão de habitats, recuperação de linhas de água e controlo de espécies invasoras — tarefas que, sem a presença dos caçadores, simplesmente não seriam realizadas.

Um ecossistema vivo: economia, cultura e natureza

A caça e o tiro desportivo formam um ecossistema económico e cultural que combina paixão, tradição e responsabilidade ambiental.
Através do investimento privado dos caçadores e clubes, milhares de hectares de território são mantidos produtivos e biodiversos, evitando o abandono rural.

“A caça é uma das poucas atividades que gera valor e, ao mesmo tempo, contribui para a conservação”, salienta Jacinto Amaro.
“É uma ferramenta de equilíbrio ecológico, de emprego e de gestão sustentável do território.”

Em muitos municípios do interior, as zonas de caça são as únicas entidades ativas na manutenção de caminhos rurais, pontos de água e povoamentos florestais, e o único motor económico capaz de fixar pessoas.
São, por isso, parceiros naturais de qualquer estratégia de conservação e desenvolvimento rural.

Entre o reconhecimento europeu e o silêncio nacional

Apesar deste contributo expressivo, Portugal continua sem reconhecer o setor cinegético como estratégico.
Enquanto Espanha, França e Itália incluem a caça nos seus Planos Estratégicos da PAC e nas políticas de biodiversidade, o Estado português mantém o setor fora dos apoios de conservação e restauração da natureza, ignorando o seu valor económico, ambiental e social.

Essa ausência de enquadramento traduz-se numa perda de oportunidades de investimento, emprego e gestão sustentável.
Ao mesmo tempo, impede o país de alinhar com o quadro europeu, que valoriza o papel do caçador como gestor do território e parceiro da conservação.

Reconhecer é investir no território

Os dados agora divulgados deixam uma mensagem clara: a caça e o tiro desportivo são parte integrante da economia e da sustentabilidade europeias.
Portugal não pode continuar a olhar para o setor com preconceito ou desinteresse.

“A caça não é o problema — é parte da solução para o futuro rural do país”, conclui Jacinto Amaro. Reconhecer este setor é reforçar o tecido produtivo, proteger o mundo rural e valorizar uma atividade que gera riqueza, preserva biodiversidade e dá vida ao território.

Jacinto Amaro
Presidente da Federação Portuguesa de Caça (FENCAÇA)

Nota de referência:
Artigo baseado no estudo académico “The socio-economic impact of hunting, sports shooting and related sectors in Europe”, coordenado por Fabio Musso (Università degli Studi di Urbino Carlo Bo) e apresentado no Parlamento Europeu em setembro de 2025, com dados divulgados pela Federação Europeia de Caça e Conservação (FACE).

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